Um monte de sujeitos, com um monte de ideias, botando a boca no mundo e sendo seus próprios predicados.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Maré punk

Não é de hoje que o espírito DIY toma conta dos dedos, mãos, recortes e aspirações das pessoas. A juventude, que sempre desponta e descobre as vanguardas, é o expoente do faça-você-mesmo desde o punk. Foi lá nos idos de 70 que, separados pelo Atlântico, jovens novaiorquinos pós-hippie-folk-rajneesh e a garotada londrina filha do operariado fizeram transgressão com as próprias mãos. Uns no CBGBs, outros na lojinha do Malcom Mclarem, cada qual com suas roupas rasgadas e cortes malfeitos; espetos e furos por todo o corpo; cabelos espalhafatosos. Mas a essa época ainda havia um mar de distância, felizmente ultrapassado por Ramones e Clash.

À esses anos, o mundo já era grande, embora a Terra desse sinais de ficar cada vez menor: a primeira transmissão de guerra pela TV (Vietnã), o primeiro homem a pisar na Lua, a bipolaridade EUA-URSS. Vêm a new wave, o Dead Kennedys, os quadrinhos do Watchmen, a Legião Urbana, a Perestroika, Collor, Nirvana e Clinton. Permeando os anos, tal qual uma costura rota, o espírito punk: fanzines, posters, hardcore, grunge, eletrônico. Daí pra frente começa-se a falar de internet — começa-se a falar na internet.

A rede não criou a roda ou a roca do DIY. Sequer as potencializou. A internet ofereceu possibilidades. Abre-se um rizoma para o punk. Para ser punk, não precisa ser punk. Se Heidegger vivesse, diria: a essência do punk, não é o punk. Fazer por conta própria nada tem a ver com niilismo ou negação ao sistema. As jaquetas fedorentas dos Pistols ainda precisavam da cena proletária, aquela com resquício na mulher trabalhando 18h por dia numa grande tecelã. A única indústria contra a qual se opõe a essência punk, isto é, o DIY, é a indústria cultural. Entenda-se ela como algo bem maior que uma fábrica da Coca Cola com seus publicitários e CEOs meio homens meio suínos.

Indústria cultural, em suma, é algo que nunca sai de moda e nunca sai da moda. Se antes da web ela tinha um poder televisivo e global, agora anda penando para surtir os mesmos efeitos de antes. Como adversário, ele o espírito punk, a essência do faça-você-mesmo, que pelos becos da rede encontrou em nichos e pequenos grupos seus fiéis escudeitos. Em frente ao pc pode-se aprender a pilotar um avião ou a fazer coisas mais nobres.

Ser punk nos novos tempos significa:

Fazer camisetas, ou tê-las sempre personalizadas:








Ter blog ou qualquer espaço para se expressar verbalmente: twitter, foruns, wiki variáveis.

Fazer música lo-fi e usar uma tecnologia tão fácil quanto e muito mais avançada para divulga-la: myspace, purevolume, trama.

Recortar, colar e dobrar muito mais que roupa ou papel: Girl Talk e Kutiman.



Ouvir Ramones na propaganda da Coca e The Clash em propaganda de telefonia:



5 comentários:

Fontes disse...

Sei lá, acho que o essencial do espírito "Faça você mesmo" (não gosto de estrangeirismos) não é telar camisetas personalizadas ou divulgar a sua banda. É mais um jeito de viver fora da sociedade de mercado. É ter sua hortinha em casa, é entrar para o terceiro setor, é se recusar a comprar algo que não seja absolutamente (absolutamente) necessário, é intervir no meio sem pedir autorização a ninguém. É uma atitude altamente anarquista. E você não precisa ser punk para fazer isso.

PS: to na brisa da jardinagem libertária faz um tempo, já consegui umas sementes e semana que vem vou no Ceasa pegar umas mudinhas. Vai ser louco.

Felipe M. Ferreira disse...

Acho que não, Fontes. DIY é muito mais uma contradição ao sistema do que uma alternativa.
Os exemplos que você deu são válidos, tirando o do terceiro setor.
Acredito que ONGs estão tão inseridas no 'sistema' quanto empresas.
Redes são o futuro: http://www.rejuma.org.br/

Fontes disse...

Desculpa. Eu usei o termo "terceiro setor" mais para falar de prestação de serviços voluntária e independente do que das poucas ONGs com cnpj, apoio governamental e o caralhaquatro. Existem milhares de coletivos, movimentos, organizações e projetos por aí, e a maioria não quer ter (e não tem) nada a ver com o "sistema".

Não saquei a diferença entre contradição e alternativa.

Felipe M. Ferreira disse...

Pra mim, alternativa é uma via paralela.
Contradição é ir de encontro.

Maria Joana disse...

Acho que peguei o que o Maia quis dizer - depois penso mais no assunto - mas tem a diferença aí da via alternativa e da contradição...